quarta-feira, 27 de março de 2013

Sonhando acordada


- Você não vai dormir? - Fazia essa pergunta à minha mãe há mais de uma hora.
- Já estou indo, pode ir deitar, só vou ficar mais um pouquinho.
Revirei os olhos, pois já tinha escutado essa resposta milhares de vezes. Mas, ela continua lá, com os cotovelos apoiados na janela observando os movimentos da rua. Ela estava tão perdida nos seus pensamentos que nem percebeu que eu já estava deitada, com as luzes apagadas.
No quarto, o barulho do ventilador me induzia ao sono. Entre um cochilo e outro, observava minha mãe. O que será que se passava na cabeça dela? Ela olhava a rua, mas não parecia ver nada. Ela sonhava.
De repente, ela se virou e me deu um sorriso. Eu retribui com o resto de forças que meu sono ainda não tinha levado.
Finalmente adormeci. Embalada pelo som do ventilador e a lembrança do sorriso da minha mãe.
Estava pedalando por um caminho simples do subúrbio, pedalando o mais rápido que podia. As casas eram recortes de papelão, com arbustos em plena floração idênticos na fachada. Queria desesperadamente voltar para a cidade, mas toda vez que alcançava uma esquina e entrava em uma nova rua, era a mesma coisa, com a mesma fileira de árvores na calçada e flores prateadas á direita do degrau de cada porta.
Um murmúrio baixo virou um estrondo alto. Olhei por cima do ombro e vi um caminhão dos correios virar a esquia e vir para cima de mim. Eu não queria ser atropelada por um motorista irresponsável, então fui para a direita, virando o guidão na direção da beira da calçada. Em vez disso, minha bicicleta levitou e começou a flutuar acima do veículo. Eu estava chocada demais para continuar pedalando, mas minha bicicleta continuou indo em frente. Esse negócio de voar era sensacional!
O caminhão desapareceu debaixo de um dossel de folhas cinza e, quando ressurgiu, havia uma mochila xadrez branca e preta saindo para fora da janela do carona. Alguém deve tê-la jogado no ar, porque ela voou para cima, direto na minha direção. A bolsa raspou a minha roda da frente antes de despencar e aterrissar aos pés de uma árvore. Eu me virei para dar uma ultima olhada, mas uma chuva de folhas me atrapalhou.
Voar já não parecia tão divertido.
Acordei de repente, sentindo minha cabeça latejar. Olhei para o relógio. Droga. Estou atrasada para a escola.
Levantei, tomei um banho rápido e quando estava pegando meu material, tive um deja-vu  quando vi minha mochila. Era a igual a do meu sonho. Estranho.
Peguei-a por baixo, e abri o zíper. Caiu um papel no chão. Agachei-me para pegar, sentando no chão para ficar mais confortável para ler:
Querida,
Vou resolver o que estava sonhando ontem na janela. Volto na hora do almoço. Te amo,
Mamãe.

quinta-feira, 21 de março de 2013

Minha vida de cão 1#

Oi gente, tudo bem?
Então, semana passada fiquei sem postar nada, eu sei, desculpa.
Enfim, resolvi que toda semana vou postar no blog uma série chamada "Vida de Cão".
É sobre a minha cachorra, Luna, e acho que em 2009, minha mãe tinha um blog escrevendo tudo como se a Luna estivesse pensando. Enfim, é bonitinho.
Ta ai:
                                           
Minha mãe me chama de "gatinha”, mas na verdade sou uma yorkshire azul-aço com canela. Não me perguntem o que isso quer dizer, acho que para valorizar meu passe inventaram essa frescura. Mas, meu passe se valoriza quando colocam os olhos em mim. Modéstia à parte, encanto no primeiro encontro.
Minha vida é quase um mar de rosas... moro com minha mãe e duas pequenas terroristas, Lina e Mirela.

Todas as segundas elas me levam para uma sessão intensa de tortura: banho. São quarenta minutos de puro terror, onde, as duas, me observam, sorridentes, como se algo divertido estivesse acontecendo. Não bastasse o esfrega daqui, escova de lá, ainda me fazem sair de lá com lacinhos cor de rosa na cabeça.
Meu passatempo preferido é dormir, mas isso se torna quase impossível quando as duas estão por perto. Elas falam demais. Mas, falam sozinhas, com um aparelhinho que não desgrudam da orelha. São tão estranhas...
Outro dia, comi um pedaço de papel que encontrei no quarto da Mirela. Impressionante a quantidade de papel que essa menina tem. Ela ficou uma fera comigo, armou um escândalo porque o tal papel era uma prova. Ela deveria ter me agradecido por eu ter dado um sumiço naquela nota antes que a mamãe visse. Não me deixou entrar no quarto dela a semana inteira.
Todas as manhãs minha mãe e eu deixamos a Lina numa espécie de clube, onde ela deve ser muito popular, pois, todas as meninas se vestem como ela. Ela passa a maior parte do dia nesse lugar e, é quando eu aproveito para xeretar o quarto dela, é inacreditável como tem tranqueira lá dentro.
Meus dias são cheios de emoção correndo e fugindo daquelas duas. Mas a minha maior alegria é quando me deito para dormir ao lado delas e sinto o quanto somos uma família

segunda-feira, 11 de março de 2013

Argaponis


Estávamos dentro do carro. Eu conseguia ouvir meu coração martelando dentro

do meu peito. Sabia que estávamos chegando, pois já havia passado por aquele

caminho diversas vezes.

Chegamos. Droga. Dentro de instantes tudo iria mudar.

Saímos do carro com cuidado para segurar o Pippo. Ele era a razão de estarmos ali, a propósito. Pippo era um passarinho da raça Argaponis, que significa ‘inseparável’ em grego. Só dá para comprar o casal, e o Pippo estava doente. Muito doente.

Tinha câncer em praticamente todo o seu lado direito. Da asa até a perninha e

a patinha. Ele não conseguia mais andar. A veterinária disse que o melhor

seria sacrifica-lo, pois  o câncer já tinha se espalhado tanto que ele não aguentaria nem mais 1 mês.

 Era o melhor para ele. Sabíamos disso. Eu sabia disso. 

Abri a porta do Pet Shop. Uma rajada de vento gelado me envolveu. A

atendente chamou a médica, e entramos na sala.  O Pippo estava na mão da

minha mãe. Eu e minha  irmã olhávamos outros passarinhos na sala enquanto minha mãe acertava os procedimentos com a veterinária. 

Elas conversaram durante um tempo e a doutora disse que era melhor fazer logo e que ele não iria sentir nada, seria como se ele fosse dormir. 

Eu comecei a chorar e saí da sala. Minha irmã ficou comigo do lado de fora. 

Devia ter se passado uns 15 minutos quando minha mãe saiu da sala 

carregando uma caixa enfeitada, com o Pippo dentro dela. 

Agradecemos. Entramos no carro, e fomos para casa. 

No caminho da volta o silêncio era total. Nenhuma de nós conseguia dizer nada, apenas ficamos perdidas nas lembranças felizes dos dias que o Pippo esteve entre nós.